CONHECENDO A INVEJA
TEMA – SENTIMENTO – EMOÇÃO – INVEJA -
COBIÇA
Quem nunca sentiu schadenfreude
provavelmente está mentindo. Sem tradução para o português, a palavra alemã
representa aquela alegria inconfessável de ver o outro se dando mal. E não há
pimenteira, figa ou reza forte que impeça a inveja de atacar, porque querer o
que é do outro faz parte da natureza – de macacos a bebês.
Quando sentimos
aquela inveja que nos faz desejar os bens materiais, o status ou alguma
qualidade, como a beleza, de outrem, a área ativada é a mesma responsável por
processar as sensações de dor física ou emocional, segundo um estudo do
Instituto Nacional de Ciência Radiológica, em Tóquio, de 2009. Ou seja: invejar
dói, de verdade.
Quando o
invejoso percebe que a outra pessoa tem um insucesso – fracassa no trabalho,
briga com a mulher ou bate o carro, por exemplo -, ele se sente recompensado
por isso. E aqui não se fala de maneira figurada: a área ativada no cérebro
quando ocorre o schadenfreude é exatamente a mesma que processa sensações de
prazer e alegria. “Esse sentimento depende de nossa percepção de quanto uma
outra pessoa é bem-sucedida. E essa percepção depende dos traços de cada
indivíduo, do que consideramos invejável”, afirma Márcia Chaves, chefe do
Departamento de Neurologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
Quer dizer: a grama do vizinho será tão mais verde que a sua quanto você
enxergar. O gramado pode estar seco e com aspecto de assombrado, mas, para quem
a invejar, será digno de final de copa do mundo. Mesmo se não houver grama.
Isso porque, em maior ou menor intensidade, ninguém está livre da inveja. E
isso não acontece porque somos pessoas más. “Os estímulos do ambiente refletem
no cérebro e essa atividade cerebral provoca a inveja. Há uma base neurológica
constituída para isso”, afirma. E não é só isso: existe mesmo a inveja boa e a
inveja má – não é mentira daquele seu vizinho que adorou seu carro novo.
O cérebro reage
de forma expressiva quando processamos esses estímulos. Primeiro, em um estágio
básico – o mais comum -, vem aquela vontade de ter o que pertence a outra
pessoa. Ou seja, o vizinho apenas queria ter o seu carro. É um passo além da
admiração, mas um comportamento natural. Em uma etapa mais avançada, a inveja
se manifesta por meio da felicidade com o insucesso do outro, com o desejo de
que algo ruim lhe aconteça – que você bata o carro ou que ele seja roubado.
Nesse caso, é o tal do schadenfreude.
Ao longo da
história, diversos personagens causaram prejuízos a oponentes que ameaçavam
roubar seu status. Em um caso famoso que entrou para a galeria de lendas sobre
a inveja, o compositor italiano Antonio Salieri teria envenenado Mozart, então
com 36 anos. Segundo o psicanalista Renato Trachtenberg, autor do livro As Sete
Invejas Capitais, a história, ainda que não seja verdadeira, é uma boa alegoria
do processo individual desencadeado pela inveja. Segundo a lenda, ao se
preocupar somente em alcançar o gênio austríaco, Salieri teria desprezado suas
próprias qualidades excepcionais. “Além de ser um excelente compositor, ele
havia descoberto Mozart, o que mostra uma sensibilidade aguçada. Ele também era
um gênio e não precisava invejar ninguém”, diz.
As pessoas com
maior propensão à inveja em nível patológico são aquelas que têm graves falhas
ou lesões nos lobos frontais do cérebro, regiões responsáveis pelo reconhecimento
das regras e pelo respeito aos outros. “Muitas vezes, apresentam traços de uma
personalidade sociopata, com comportamentos não aceitáveis socialmente. Então,
elas não querem mais o que o outro tem, mas sim ser exatamente o que o outro
é”, afirma Márcia Chaves.
Uva
ou pepino?
Dá para colocar (parte) da culpa na evolução – e nem os macacos estão livres da inveja. Pesquisadores do Instituto Yerkes, em Atlanta, nos Estados Unidos, detectaram traços de inveja em outros primatas. Dois macacos recebiam pepinos para colaborar com a pesquisa, até que um dia um deles ganhou algo mais saboroso: uvas. Aquele que continuou recebendo o pepino se tornou mais hostil durante os trabalhos – não há mais bobo na pesquisa científica.
Dá para colocar (parte) da culpa na evolução – e nem os macacos estão livres da inveja. Pesquisadores do Instituto Yerkes, em Atlanta, nos Estados Unidos, detectaram traços de inveja em outros primatas. Dois macacos recebiam pepinos para colaborar com a pesquisa, até que um dia um deles ganhou algo mais saboroso: uvas. Aquele que continuou recebendo o pepino se tornou mais hostil durante os trabalhos – não há mais bobo na pesquisa científica.
Na verdade, a
inveja teve um importante papel. Em uma época primitiva, desejar o que o outro
conseguia era um indicativo de quanto seria possível conquistar em determinado
ambiente: se um macaco conseguia dois cachos de banana, mas um outro obtinha
cinco, o invejoso percebia que ele também poderia voltar para casa com uma
quantidade maior. Esse componente estimulava a competição, que serviu para o
desenvolvimento da espécie. “As áreas do cérebro que processam a inveja, entre
outras sensações, só aparecem nos primatas e em alguns mamíferos. Trata-se de
um mecanismo evolutivo importante. Do contrário, o cérebro sequer nos
disponibilizaria esses mecanismos”, analisa Márcia Chaves.
O psiquiatra
José Toufic Thomé concorda: “É um dos nossos sentimentos mais primitivos.
Quando começamos a perceber o mundo, a inveja logo se manifesta: o que o outro
tem, eu quero ter ou quero ser. Temos uma carga de instintos que contém inveja.
É um comportamento evolutivo: se eu tenho que sobreviver, preciso usar todos os
meus recursos, mesmo os mais primitivos”, afirma.
Até
os bebês são invejosos
Nem mesmo aquele bebezinho fofo sendo amamentado pela mãe está livre de sentir inveja. Conforme conceito da psicanalista austríaca Melanie Klein, a inveja se manifestaria no contato com a mãe, durante a amamentação. Ela chamou esse sentimento de “inveja do seio”. Conforme a teoria, o bebê não suportaria a ideia de que não é ele quem produz seu próprio alimento, percebendo uma condição de dependência em relação à mãe. “No momento em que o bebê passa a perceber que o leite que necessita é fruto do seio de uma mãe que tem esse poder de criar esse alimento, o sentimento de inveja é acionado com toda a sua força primitiva, e a reação inicial é de rejeitar ou destruir essa percepção frustrante”, afirma César Brito, psicanalista e professor da faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
Nem mesmo aquele bebezinho fofo sendo amamentado pela mãe está livre de sentir inveja. Conforme conceito da psicanalista austríaca Melanie Klein, a inveja se manifestaria no contato com a mãe, durante a amamentação. Ela chamou esse sentimento de “inveja do seio”. Conforme a teoria, o bebê não suportaria a ideia de que não é ele quem produz seu próprio alimento, percebendo uma condição de dependência em relação à mãe. “No momento em que o bebê passa a perceber que o leite que necessita é fruto do seio de uma mãe que tem esse poder de criar esse alimento, o sentimento de inveja é acionado com toda a sua força primitiva, e a reação inicial é de rejeitar ou destruir essa percepção frustrante”, afirma César Brito, psicanalista e professor da faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
Essa primeira
relação desenvolvida entre o bebê e a mãe, que faz com que o recém-nascido
perceba que não está sozinho, que há outro de quem sua sobrevivência depende,
vai se refletir em novas áreas de sua vida. “O bebê precisa desenvolver a
capacidade de tolerar as frustrações, reconhecer que as diferenças existem para
que se desenvolva de forma mais saudável”, afirma.
Mas, se nem ao
longo da vida é fácil aprender essa lição, tentar “curar” a inveja também
parece uma missão impossível. “Tirar a inveja de alguém seria como amputar essa
pessoa”, afirma o psicanalista Renato Trachtenberg. Mesmo os casos mais
exacerbados de inveja não têm uma cura definitiva. Não é como uma cirurgia em
que a doença é extirpada. Quando atinge níveis patológicos, o sentimento de
inveja pode ter desfechos trágicos. Em uma versão moderna do fratricídio
cometido por Caim contra Abel, em 2011 um jovem confessou ter matado o próprio
irmão por invejar seu sucesso. O crime bíblico foi cometido porque Caim
acreditava que Deus privilegiava Abel. Na versão urbana, no Mato Grosso, ambos
eram DJs e o assassino reclamou que o irmão era mais requisitado para festas.
Como ainda não
há uma base de estudos neurocientífica que detalhe todo o caminho percorrido
até que o pecado se consuma, uma das abordagens adotadas no tratamento é a
psicanalítica: a inveja tem de deixar de interferir em nossa vida. Ou seja, se
deixar de invejar é mesmo impossível, pelo menos dá para transformá-la em
estímulo.
Demônio
– Leviatã
Um dos dez mandamentos dizia: “Não cobiçarás”, o que vale para a mulher do próximo, mas também para o carro do próximo, a casa do próximo, o corpo sarado do próximo… O capeta da inveja é representado por um dos príncipes do inferno, o Leviatã. O monstro importado da mitologia já aparecia no Antigo Testamento como dragão marinho, serpente, baleia e até como um crocodilo, disposto a engolir suas vítimas sem piedade.
Um dos dez mandamentos dizia: “Não cobiçarás”, o que vale para a mulher do próximo, mas também para o carro do próximo, a casa do próximo, o corpo sarado do próximo… O capeta da inveja é representado por um dos príncipes do inferno, o Leviatã. O monstro importado da mitologia já aparecia no Antigo Testamento como dragão marinho, serpente, baleia e até como um crocodilo, disposto a engolir suas vítimas sem piedade.
Baile
de máscaras
Cobiça é querer o que não se tem
Ciúme é uma relação que envolve um terceiro, uma disputa por afeto ou atenção de algo/alguém que já se conquistou
Cobiça é querer o que não se tem
Ciúme é uma relação que envolve um terceiro, uma disputa por afeto ou atenção de algo/alguém que já se conquistou
Inveja é uma
relação dual: alguém quer ter ou ser o que o outro já conquistou ou é
Schadenfreude é
o êxtase do invejoso: a alegria que ele sente quando o invejado fracassa
Admiração parte
de um vazio, do princípio de que algo está faltando ¿ só admiramos o que não
temos: assim, pode ser considerado um tipo inicial de inveja
A inveja está na cabeça
O mais dissimulado dos pecados provoca sofrimento, alegria e depressão. Os estímulos do ambiente refletem no cérebro, que processa a inveja
O mais dissimulado dos pecados provoca sofrimento, alegria e depressão. Os estímulos do ambiente refletem no cérebro, que processa a inveja
Eu quero
A serotonina é responsável pela inveja. Pessoas com problemas de comportamento registram a falta desse hormônio.
A serotonina é responsável pela inveja. Pessoas com problemas de comportamento registram a falta desse hormônio.
Inveja que dói
Quando a inveja se manifesta, é ativada a área do cérebro conhecida como córtex cingulado anterior, a mesma em que é processada a sensação de dor física.
Quando a inveja se manifesta, é ativada a área do cérebro conhecida como córtex cingulado anterior, a mesma em que é processada a sensação de dor física.
Benfeito
Ao sentir prazer pelo insucesso alheio, a área cerebral estimulada é o estriado límbico, a mesma região responsável pelos sentimentos prazerosos, de alegria ou recompensa.
Ao sentir prazer pelo insucesso alheio, a área cerebral estimulada é o estriado límbico, a mesma região responsável pelos sentimentos prazerosos, de alegria ou recompensa.
Azar o seu
Pessoas com lesões ou falhas nos lobos frontais do cérebro são mais propensas à inveja. Dependendo do estágio, a inveja exacerba os sentimentos de injustiça e desigualdade, quadro que pode evoluir para a depressão clínica.
Pessoas com lesões ou falhas nos lobos frontais do cérebro são mais propensas à inveja. Dependendo do estágio, a inveja exacerba os sentimentos de injustiça e desigualdade, quadro que pode evoluir para a depressão clínica.
Tô
nem aí
Pessoas com coágulos ou lesões no córtex pré-frontal ventromedial (área ligada a condutas sociais e tomada de decisões) tendem a não sentir inveja ou prazer pelo insucesso alheio.
Pessoas com coágulos ou lesões no córtex pré-frontal ventromedial (área ligada a condutas sociais e tomada de decisões) tendem a não sentir inveja ou prazer pelo insucesso alheio.
Quando
a inveja não é tão ruim assim
Morrer de inveja do colega mais bem-sucedido pode servir de combustível para te levar a galgar degraus no trabalho ou na escola
Morrer de inveja do colega mais bem-sucedido pode servir de combustível para te levar a galgar degraus no trabalho ou na escola
Você torceria o
nariz para um currículo profissional que contivesse a inveja como uma
habilidade. Mas o fato é que o pecado pode ser um tremendo combustível para o
desenvolvimento. Em outras palavras, invejar o sucesso alheio, em um ambiente
competitivo, pode ser o que faltava para ampliar a produtividade.
Não importa se é
na escola, na família, no trabalho, entre amigos. Somos incentivados a querer
sempre mais, mantendo um modo de vida e uma forma de pensar baseados no embate.
“Há um estímulo à competição. A partir daí, as pessoas reagem de diferentes
maneiras: algumas são estimuladas, outras sofrem”, diz Márcia Chaves, do
departamento de Neurologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
Nesse cenário, a
inveja é uma via de mão dupla: provocar o desejo alheio, convidar o outro ao
pecado, é encarado como uma espécie de antídoto contra os próprios maus
pensamentos. “Existem pessoas que querem se livrar da sua inveja fazendo com
que alguém as inveje”, afirma o psicanalista Renato Trachtenberg. Por outro
lado, há quem se sinta desconfortável em progredir ou adquirir bens, com medo
de se tornar vítima da inveja.
Inveje,
mas trabalhe
Aquela história de pontuação, metas de vendas, equipes contra equipes para chegar ao melhor resultado, como algumas empresas estimulam, pode ser saudável? A inveja pode ser encarada como uma forma de aumentar a disputa entre os trabalhadores e melhorar a produtividade. Essa relação pode ser positiva para o crescimento das empresas e dos próprios funcionários. Mas, em estágios avançados, gera prejuízos para as equipes. “A inveja está presente no mundo corporativo. As pessoas acabam fazendo de tudo para permanecer em seus cargos ou subirem na hierarquia”, afirma a psicóloga Glaura Verdiani, autora da tese Um Estudo Sobre a Inveja no Ambiente Organizacional. O verdadeiro impulso motivacional dos empregados não está mais em fatores externos como dinheiro e relacionamento interpessoal, mas em aspectos internos, dependendo do sentido que cada indivíduo atribui ao trabalho. Essa mudança de percepção revolucionou o gerenciamento corporativo. Se a motivação parte de cada um, a inveja impulsiona o empregado na disputa dentro da empresa.
Aquela história de pontuação, metas de vendas, equipes contra equipes para chegar ao melhor resultado, como algumas empresas estimulam, pode ser saudável? A inveja pode ser encarada como uma forma de aumentar a disputa entre os trabalhadores e melhorar a produtividade. Essa relação pode ser positiva para o crescimento das empresas e dos próprios funcionários. Mas, em estágios avançados, gera prejuízos para as equipes. “A inveja está presente no mundo corporativo. As pessoas acabam fazendo de tudo para permanecer em seus cargos ou subirem na hierarquia”, afirma a psicóloga Glaura Verdiani, autora da tese Um Estudo Sobre a Inveja no Ambiente Organizacional. O verdadeiro impulso motivacional dos empregados não está mais em fatores externos como dinheiro e relacionamento interpessoal, mas em aspectos internos, dependendo do sentido que cada indivíduo atribui ao trabalho. Essa mudança de percepção revolucionou o gerenciamento corporativo. Se a motivação parte de cada um, a inveja impulsiona o empregado na disputa dentro da empresa.
Em teorias da
psicologia aplicada à administração, acredita-se que, depois de compararmos
nosso insucesso ou fracasso com o dos colegas, tendemos a buscar um equilíbrio
em relação aos outros. “Por exemplo, se o indivíduo constatou que o
esforço-recompensa do outro foi superior ao seu. É nessa condição de estar
`sub¿ em relação ao outro que nasce a inveja, solapando o impulso
motivacional”, aponta Glaura Verdiani. Durante a pesquisa, o que a psicóloga
percebeu é que, em vez de o trabalhador ficar desmotivado pela inveja, ele
acaba sendo estimulado por ela. Para Trachtenberg, o ambiente empresarial
“estimula parentes próximos da inveja, como a voracidade, a avidez e a
rivalidade”. A lição é: vale, sim, invejar, mas só se for para subir pelos
próprios méritos.
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Gratidão pela presença tão presente.
jaya terapias corporais - sistêmica e quântica
bit.ly/jayaterapiasholisticas